O Porão
Sentado em uma
cadeira, amordaçado, amarrado.
- Estou na casa dos Horrores.
- Espero por
mais uma tortura, já passei por várias e, ainda suspiro, pois o meu coração cisma
em continua batendo; já foram à pimentinha, uma maquina que dá choques elétricos
nas genitálias, o pau de arara e o afogamento. Agora não sei se vai ser o sal
nos olhos ou mais uma sessão de espancamento.
Querem que eu
entregue um amigo que eu não conheço, querem que eu fale o que não sei.
E apesar de
falar que nada sei; eles continuam a me manter em cativeiro e me espancam
esporadicamente.
Nesse raro
momento de paz, mas com o meu corpo inteiro dolorido, fruto, esse das grandes,
longas e humilhantes torturas que sofri.
- Penso no
passado e nas histórias de colegas de faculdade que sucumbiram nos porões da
Ditadura Militar e me vejo na mesma posição. Nunca acreditei que um ser humano
poderia tratar outro igual, dessa maneira que me trataram e tratam ainda.
- Pouco antes
de ser pego pelo DOPS, eu estava deitado em minha cama lendo, quando a porta
foi arrombada e pessoas encapuzadas entraram gritando e me batendo, passei por
um corredor polonês, até entrar em um carro e ser encapuzado, depois disso eu
vim parar aqui, só sei que se chama Casa dos Horrores.
E aqui estou
privado dos meus direitos de cidadão. - Maldito AI-5, que tirou todos os meus
direitos e de todos os brasileiros, na chamada missa negra em uma sexta feira
13 de dezembro – meus professores muitos deles sumiram – devem estar aqui ou já
morreram; não sei, só sei que estou nesse inferno, nesse tormento, no escuro
amarrado e ninguém pode me ajudar; os meus gritos não são ouvidos por ninguém e
só posso me apegar ao estado de direito como se fosse um sonho, mas me
questiono, que direto?
- Aqui, uns
gritam, quais foram às siglas malditas que lhe prenderam! C. C. C., DOPS, DOI –
CODI! - Mas agora isso não importa, pois estamos todos juntos na mesma merda! -
Chorar? - Mera ilusão, não adianta, pois todas as lágrimas já secaram e o
saudosismo é a única coisa que se faz presente, aliás, é a única coisa que eles
não podem nos tirar, pois todo o resto eles já conseguiram, integridade,
orgulho e humanidade.
- Lembro-me
das passeatas, a dos Cem Mil, no Rio de Janeiro, com vários cantores
engrossando as fileiras de protesto; lembro-me do calabouço e a morte de Edison
Luiz, o estopim para a juventude estudantil lutar, pois tínhamos um cadáver do
nosso lado, e a impressa divulgava tudo isso.
- Mas de lá
pra cá, muitos jovens já pereceram em combates ou nos fétidos porões da
Ditadura, uns nas guerrilhas urbanas com grandes feitos, mas com pouco efeito,
lembro do seqüestro do Embaixador Americano – ah! Isso foi um golpe de mestre
do MR-8, mas com pouco resultado para a causa em si, mas nos mantendo vivos na
luta pela liberdade de direto, a guerrilha do Araguaia, onde muitos morreram
tentando livrar esse país da opressão, mas tudo isso esquecido pelo tri da
seleção.
Mas agora nada
disso importa, pois estamos aqui, todos juntos. Aqui tem tantos Joãos, Pedros,
Paulos e Marias, todos sem identidade verdadeira, - mas o que isso iria me adiantar
nessa hora? - Não nos respeitam, até
parece que não somos brasileiros. Eu sou mais um nesse aglomerado de nomes
esquecidos e guardado em mais um porão empoeirado.
Pois é, sei que logo vou morrer e a minha família
nada saberá, sumirei virarei pó; mas se alguém me perguntar, se tenho esperança,
responderei – ela é a última que morre; porem é a primeira que mata – mas ainda
continuaria tendo esperança
Francisco
Maia..........................................23/02/07