III
Séculos de Vida.
Vim
de África, Ogum, Oya, morri no novo mundo,
Mudei
de alma, e orei para São Jorge e Santa Bárbara,
Deixei
o meu mundo, dancei no terreiro, chorei na senzala.
E
doei sangue no pelourinho, soei chibatadas.
Corri
um pedacinho de terra, parei em Palmares,
Lá
fomos todos iguais, morri por Zumbi e Dandara. Morri pela liberdade!
Caminhei
em alma crua nos sertões, pés machucados.
Extraí
ouro nas feridas abertas no veio da terra, feri minhas mãos.
Lombo,
ardeu, ardeu, fui para Piratininga.
Colhi
café, raspei terra, andei, andei, era tudo do sinhozinho,
Apanhei
de vara de marmelo, morri novamente, sofri, doeu, sou negro.
Meus
olhos abriram, renasci. O soluço, o choro, a morte não tinha me levado,
A
vida veio, eu nego com a liberdade Áurea, dois artigos e nenhuma justiça
social.
Subi
o morro, correram com a gente dos cortiços, não me deram emprego, não sei ler.
300
anos de escravidão, muitas mortes e muitos nascimentos, muita dor.
130
anos do fim da escravidão, não sinto a liberdade, vivo sem muitos direitos,
Os
quais são privados, ainda são reclamados, ainda luto por liberdade, justiça e
igualdade.
O
meu grito não é mais um gemido amordaçado, o meu grito é a revolta.
O
meu medo não é da morte, o meu medo é da injustiça.
Não
nasci no novo mundo, eu renasci no Brasil.
Eu
cresci reencarnando, hoje sou forte, sou negro, sou brasileiro.
Não
vim porque quis, mas estou aqui para ficar.
Me
respeita, pois aqui também é meu lar.
Francisco Maia.